Debate pretendeu demonstrar a importância da Licenciatura em Proteção Civil e Gestão do Território que está pronta a arrancar

Numa organização do Instituto de Ciências Sociais (ICS) da Universidade do Minho, no quadro de uma iniciativa conjunta do CEGOT e do CECS, realizou-se ao fim da tarde do dia 15 de novembro, na sala de atos do ICS, um debate intitulado: “Fogo Cruzado: incêndios, gestão do território e responsabilidade social”. Na oportunidade foi apresentada a Licenciatura em Proteção Civil e Gestão do Território da UMinho.

A presidente do ICS, Helena Sousa, já no dia 8 de novembro, na sessão solene das comemorações do 41º aniversário do ICS, tinha anunciado que a Licenciatura em Proteção Civil e Gestão do Território deveria integrar o leque de cursos da Universidade do Minho no próximo ano letivo, uma vez que tinha sido aprovada pela A3ES - Agência de Avaliação e Acreditação do Ensino Superior e registada pela DGES - Direcção-Geral do Ensino Superior em 2015. Tinha feito notar, na oportunidade, que o projeto se tem mantido na gaveta facto que disse ser “absolutamente incompreensível” especialmente numa altura em que o país enfrentou uma das piores épocas de incêndios da sua história. Nesse sentido, esta iniciativa serviu para lembrar que a nova licenciatura já fazia sentido antes, sendo que, segundo Helena Sousa, que moderou o debate, “não deveríamos precisar destas tragédias mais recentes para perceber a importância de uma formação séria, num plano universitário, nesta área”.

António Vieira, docente no Departamento de Geografia da UMinho, que apresentou a Licenciatura em Proteção Civil e Gestão do Território, disse que o plano curricular do novo curso garante que terá uma “oferta de qualidade e inovadora por assentar num leque de conhecimento diversificado”. A licenciatura é proposta pelo ICS e pela Escola de Engenharia, envolvendo mais de 50 docentes doutorados. O que constitui um passo em frente, tanto mais que, atualmente, apenas alguns politécnicos e a Universidade dos Açores têm licenciaturas na área da Proteção Civil. Já António Bento Gonçalves, também docente do Departamento de Geografia da UMinho, abordou a temática “Incêndios florestais em Portugal continental em 2017: crónica de uma tragédia anunciada”, salientando que o atual sistema de proteção civil “não está preparado para enfrentar este novo regime de incêndios extremos”. Defendeu que, “ou nos adaptamos ou iremos ver repetidas estas situações dramáticas”, mesmo que referisse que o ano de 2017 “foi completamente anormal” e que houve uma conjugação de fatores que contribuíram para a tragédia. Mesmo reconhecendo a eficácia dos bombeiros, disse ser impossível controlar a totalidade de 17 mil ocorrências, que foi o número contabilizado até 31 de outubro deste ano. Já o chefe da Divisão Municipal de Proteção Civil de Braga, Vítor Azevedo, que abordou “O papel da proteção civil municipal em grades operações”, disse existir falta de enquadramento legal dos sistemas municipais de proteção civil, observando que a coordenação funciona até ao nível distrital. Nesse sentido, é exigível “um novo paradigma de legislação”. Sobre a nova licenciatura, defendeu que “a qualificação dos recursos humanos é cada vez mais premente”.

 

Adriano Miranda e “A senhora de preto”

O fotojornalista do “Público”, que esteve em Pedrógão Grande e é dos poucos que tem imagens da tragédia desde o seu início, começou por ler uma crónica que escreveu para o jornal para onde trabalha e que intitulou “A senhora de preto”. As palavras do repórter serviram de mote para a sua intervenção, que tocou pontos essenciais na profissão de jornalista, como a dimensão ética do trabalho, nomeadamente o respeito que se deve ter pela dor das outras pessoas.

Disse que a dimensão trágica de Pedrógão foi tão grande que nunca tinha assistido a tal coisa, “nem em cenários de guerra”. E que foi descobrindo o horror sozinho e verificando que se tratava de um incêndio anormal, tanto mais que já lhe tinham telefonado do jornal a dizer que o Presidente da República se dirigia para lá. Isso e o número de mortos que, num primeiro anúncio que ouviu na rádio, já chegava às 16 vítimas. Era muita vítima, pelo que o incêndio seria das piores coisas com que se iria deparar na sua vida de mais de 20 anos de fotojornalista. Mas, como referiu, “quando somos chamados, não podemos atirar a toalha ao chão”. Curiosamente, ia a caminho de uma sardinhada com amigos, quando lhe telefonaram do jornal marcando-lhe o serviço de Pedrógão. “Fui à procura das chamas”, disse Adriano Miranda, que chamou a atenção para o facto de não haver formação por parte dos jornalistas para lidarem com este tipo de casos: “Arriscamos sempre, via instinto. A minha preocupação foi enviar as fotos o mais rapidamente possível para a redação, não fosse o diabo tecê-las”.

Falou, depois, sobre a ética e o respeito pelas vítimas, sendo que o dever de informar não deve passar por cima do respeito pelo sofrimento dos outros: “Sendo o nosso dever, devemos saber até onde podemos chegar. Houve excessos e, neste contexto, a palavra dignidade é essencial. E as pessoas têm o direito a recusar uma foto, e isso é para respeitar”. É deste quadro que é publicada “a foto do senhor Francisco” (que se reproduz nesta peça*), que fez a primeira página do “Público” e que encheu as redes sociais. Mas que foi tirada, diz o fotógrafo, com a anuência de quem se deixou fotografar, que tinha acabado de perder um amigo no fogo, e que lhe disse ser feio para o ‘boneco’ pretendido.

 
Texto e fotos: Vítor de Sousa

*Fotografia da autoria de Adriano Miranda (jornal “Público”)